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Livro
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quinta-feira, 8 de Agosto de 2024 - 14:30

Estranho. Muito estranho. Um dos livros mais enigmáticos que já li.

À medida que ia lendo, vinham-me algumas lembranças, que me pareciam indicar alguma referência. Lembrei do impacto das peças que vi nos anos 60, “Cemitério de automóveis” (Arrabal) e “O Rei da Vela” (Oswald de Andrade). Seria este livro um “teatro do absurdo”?

Depois, veio-me a impressão de ser um realismo fantástico ou mágico, aquele de autores latinos. Veio a memória de um livro dessa época, descrevendo um congestionamento, interminável. Não lembro mais qual autor. Pra confundir mais ainda, lembrei da “Metamorfose”. Mas nada se igualava, nem aos delírios surrealistas de Dali na pintura. Ai, eu lembrei ter visto um quadro do Chagal (conterrâneo do Bulgákov). Mostrava um Cristo crucificado, em primeiro plano, cercado por personagens do povo, símbolos judaicos, barco (com fugitivos), exércitos, discípulos lamentando, cidades incendiadas. Talvez a imagem que mais se identificava com o livro.

Porém, lendo sobre a vida do autor, fui entendendo a obra, entendendo, mas só um pouquinho.

Eu acho que é um jogo de metáforas, tudo é simbolismo. Isto porque seria a maneira de ter dito o interdito. As circunstâncias vividas pelo o autor podem dar algumas indicações.

Nascido e criado sob o Czarismo viveu as revoluções (ou golpes) russos, os assassinatos, a vitoria bolchevick, implantação do comunismo e o seu domínio total – sobre o governo, o Estado, a economia, a sociedade, os indivíduos, as mentes.

Por certo reflete, sobretudo, as contradições a que Bulgákov se submeteu: serviu (ou teve de servir) num exército enquanto seus irmãos estavam no exercito inimigo. Teria tido a proteção do novo imperador russo, Stalin, que lhe garantiu... continuar vivo. Criado por pais e avós religiosos e estudiosos da fé, teve de se converter e valorizar o materialismo ateu. Suas obras tinham reconhecido valor e, por isso mesmo, eram censuradas e proibidas. Vivia sob um regime de absoluta opressão porque o objetivo desse regime era libertar. “Durma-se com um barulho desses”, diria o popular.

O Mestre e Margarida é uma crítica mordaz ao regime soviético expondo suas mazelas. Na história, ou nas histórias, que conta Bulgákov mostra a crise imobiliária - onde várias famílias habitam o que fora o apartamento de uma só; o “denuncismo” dos cidadãos contra outros -para se valorizarem perante o regime; a censura absoluta – nas artes, nas atitudes e até no que se pensa; o medo permanente– de crer numa religião, de contrariar um funcionário; de ser denunciado; de portar alguma moeda estrangeira; de fazer uma crítica; de possuir qualquer bem; de ser preso e/ou condenado à prisão ou a um hospício...

Já “realismo” parece ser o que o autor viveu na sua vida real. E o “fantástico” é o que ele cria para poder contar a realidade. Uma história de amor interrompido; um talento literário esmagado pela opressão da critica e censura; uma narrativa da paixão de Cristo como uma história fantástica, a exibição de poderes satânicos como mágica circense, e a realidade fantástica que enlouquece cidadãos. Mostra um mundo demoníaco, com o mestre do mal e seu séquito interferindo na realidade, transformando coisas e pessoas, aparecendo e desaparecendo, tudo incrível.

Foi quando me lembrei da Alice no País das Maravilhas e do Harry Potter. E com a licença e o pedido de perdão a Bujlgákov por esta comparação infeliz.

E nada comentei sobre a narrativa e a história contada no livro. Por quê? Porque Você vai ter de ler esse livro. A-bra-ca-da-bra!