Agosto
1ºde agosto de 1.954, Rio de Janeiro, capital da República. Enquanto no edifício Deauville um empresário é assassinado, outro crime é planejado no Palácio do Catete, sede do governo federal. Gregório Fortunato, o Anjo Negro, prepara um atentado contra o jornalista Carlos Lacerda, opositor ao governo de Getúlio Vargas. Essa tentativa frustrada de atentado causará uma das maiores reviravoltas da história do Brasil, culminando com o suicídio do Presidente.
Enquanto o país se divide entre fanáticos contra e a favor do governo de Getúlio, o comissário de polícia Alberto Mattos tenta desvendar o crime do edifício Deauville. Mattos começa a suspeitar de ligações entre o caso que investiga e o atentado a Carlos Lacerda, como se, por um momento, a vida de um homem comum e a da nação se confundissem.
Um dos maiores sucessos de crítica de Rubem Fonseca, Agosto nos propõe uma pergunta: em que medida a história de uma pessoa e a história de um país se determinam, se diferenciam e se assemelham? Ao misturar, com maestria, história e ficção, Rubem Fonseca demonstra que a resposta a essa pergunta, que não permite saídas fáceis, se encontra apenas na boa literatura.
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APPIO
17/06/2020 - 16:51
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Agosto
Agosto
de Rubem Fonseca
Uma verdadeira. Outra ficção.
Como tornar uma ficção tão verdadeira e contar a verdade parecendo ficção?
Para mim, está aí a genialidade de Rubem Fonseca, que eu desconhecia como romancista talvez tenha lido alguma crônica (no O Cruzeiro? Na Manchete? Em que jornais?), mas não lembro.
Mas lendo o Agosto, comentei com uma amiga: ele me fez sentir como o Repórter Esso: “a testemunha ocular da historia”. Passou mais de meio século, e um fato que nunca esqueci: o dia em que fui com meu à casa de um amigo dele, o Senhor Varela, num sábado (ou domingo) de meados de agosto de 1954. Eles conversavam e eu fiquei vendo aquela televisão grande, com a imagem que subia e descia e falhava, em preto e branco, e que apresentava uma “novidade”: estavam transmitindo diretamente do Rio de Janeiro para São Paulo. E o que eu vi? Vi um senhor de óculos, mancando, desenhando esquemas num quadro negro (ou quadro branco?) e fazendo as mais terríveis acusações contra o Presidente da República. Era o Carlos de Lacerda. Nos meus inocentes 10 anos ele me prendeu e convenceu: o Presidente era um bandido, um corrupto, um golpista, um assassino... e passei também a odiá-lo. Poucos dias depois, aquele que eu passara a odiar se suicida! Senti o maior remorso! Por isso nunca me esqueci.
E agora lendo “Agosto” eu fui me lembrando dos nomes que freqüentavam as discussões da época em casa, ou que meu pai comentava ao ler seus os jornais, ou ouvindo o Grande Jornal Falado Tupi. Generais, Ministros, Filhos e Filha e Irmão, Ministros, Deputados, Senadores...
E embora fosse criança, eu sempre ficava junto e ouvia todas as conversas. E depois, gostando, passei a ler. Para mim, o Livro retrata com total fidelidade aqueles acontecimentos que puseram fim a era Vargas. A crise política daquela época faz a que dizem haver hoje parecer brincadeira de escoteiro. Era um estado de pré-revolução, mesmo. A cisão nas forças armadas era fato, como era fato a politização das armas.
Neste livro “dois em um”, o um – a História real – é uma verdadeira reportagem, daquelas que chamavam de jornalismo investigativo, pra valer: sem adjetivos, sem opiniões, sem partidarismos, jornalismo puro. Fatos e circunstâncias. É um jornalismo delicioso de se ler, com os contornos de uma novela, em que cada capítulo estimula a querer ler o próximo. E todos eletrizantes, como nas telenovelas. (Aliás, esse já foi tema de novela, há muitos anos, acho que da Globo, e o Toni Tornado era o Gregório Fortunato).
Mas aí, o grande repórter veste o paletó do ficcionista. Depois de ler o livro, fui ver biografia do Rubem Fonseca e: Bingo! (que naquele tempo não existia, só havia o jogo do bicho mesmo). A autenticidade dada no livro ao sistema policial na apuração do crime do Edifício Deoville e a estrutura do crime que se organizava, bem como a construção tão real dos os personagens - delegados, investigadores, contraventores, alcagüetes, prostitutas, lupanares – só poderia ser tão bem descrita por quem conhecia tudo aquilo por dentro. Rubem Fonseca foi um Alberto Mattos – comissário de Policia.
Certas imagens, certos eventos, certos hábitos, certos locais, certas expressões e gírias - que passam e se perdem com o tempo - são restauradas no livro e expressam a atualidade compondo as descrições daqueles momentos.
E mais uma virtude: um Historiador meticuloso. Provavelmente colecionou depoimentos, registros e documentos, sobretudo capturados das páginas dos jornais.
E tudo isso com perfeito domínio da narrativa, entrelaçando duas histórias, ambas com suspense, mesmo que de uma já conhecemos o capitulo final.
Nada a dever aos grandes romancistas policiais desta e de outras línguas.
E pra quem acha que Cem Anos de Solidão é obra prima pelas dezenas de personagens, Você sabem quantos personagens com nomes próprios são citados por Rubem Fonseca neste livro? E nenhum gratuitamente? Pasmem: 163 personagens (Cento e sessenta e três) na Historia Real e 63personagens (Sessenta e três) na ficção. Eu os listei e contei.
Espelho meu, se existir alguém mais chato do que eu, por favor, confira.
quatro primeiros